Os Recomeços do Não

por Giba Assis Brasil
em 21 de julho de 2008

No final de 1997, quando a Casa de Cinema de Porto Alegre ia fazer 10 anos e todo mundo estava colocando alguma coisa na internet, a gente decidiu que a Casa deveria ter um sítio, mesmo sem entender muito bem o que isso significava. Pois foi aí que o Jorge teve uma idéia mais divertida: por que não colocar o Não na internet?

O Jorge, na verdade, nunca tinha escrevido pro Não, mas tinha lido alguns números, e pelo jeito queria recuperar o tempo perdido. Eu e o Gerbase, que tínhamos participado da geração anterior, aderimos prontamente à idéia. Mas as sócias-mulheres da Casa reagiram de forma desigual: a Luli terminou virando colaboradora assídua e mesmo editora em alguns números, a Nora fez um ensaio fotográfico mais tarde auto-censurado, a Ana tá devendo até hoje.

O “novo Não” terminou entrando no ar no dia 23 de dezembro de 1997, junto com o sítio da Casa. O Jorge, o Gerbase e eu seríamos o Conselho Editorial, reforçado por alguns editores-rotativos e um bando de colaboradores eventuais. Como insistíamos numa continuidade com o “Não em papel”, que tinha parado no número 52, quatorze anos antes, a primeira edição na internet saiu como “Não 53”.

No primeiro editorial, o Jorge explicou:

Por que não? Porque há 22 anos um grupo de bravos jovens portoalegrenses resolveu editar um jornalzinho hiper alternativo chamado “Não”, expondo ao mundo o seu descontentamento, sua raiva, suas paixões, sua intolerável adolescência. (…) Porque a gente quer dar espaço para os que são contra quem tem poder demais. (…) Porque é impossível ter um endereço na internet com til. (…) Porque quase todo mundo está dizendo sim. (…) Porque é muito cômodo escrever a favor mas é muito mais divertido - e transformador - ler contra. (…) Porque sempre se tem vinte anos em cada perna em algum canto do coração. Porque sim.

Na convocação para o número seguinte, eu tentei conciliar a continuidade e a novidade:

O Não voltou. De verdade. Desde 1975 circulando de mão em mão. Desde 1982 desaparecido sem deixar pistas. Agora de volta na Internet: o número 53 foi editado em dezembro de 1997 e está no ar. E daí? Daí que agora temos a obrigação de fazer o número 54, o 55, o 82A, o 397, etc. Mas um de cada vez, é claro. O número 54 vai sair em abril e o editor serei esse que vos falo. Como na encarnação anterior, o Não se caracteriza por não ter leitores, apenas colaboradores.

Os assuntos, como sempre, são qualquer um. Mas nós estamos seriamente empenhados em discutir “as relações entre o público e o privado”, no Não e fora do Não, na privatização da Light e na estatização da RBS, na responsabilidade do Sérgio Naya e na de quem quer cassar o Sérgio Naya, no estágio da moça que comeu o Clinton e no do desemprego globalizado, no povo e no em nome do povo, agora e na hora de nossa morte amém. A justificativa teórica, a conveniência política, o embasamento da pauta é que: sei lá, acho que isso rende uma conversa.

Aceitamos qualquer colaboração - e só publicaremos as que a gente achar legal. Não devolvemos originais, não pagamos direitos, não garantimos satisfação e muito menos o seu dinheiro de volta. Quem quiser ter garantia de publicação do que escreve, um bom salário, ser dono de um jornal, etc, procure a Zero Hora.

E assim seguimos. Foram 7 edições em 1998, 8 em 1999 e 5 em 2000, período em que o Não foi quase bimestral. Depois, passou a semestral: apenas duas edições por ano em 2001, 2002 e 2003. E só uma por ano em 2004, 2005 e 2006. Nenhuma em 2007.

Durante algum tempo, dizíamos que o Não era uma espécie de “projeto paralelo” da Casa de Cinema, que a gente tocava com mais disposição quando não tínhamos filmes pra fazer. Revendo estes dados e comparando com a nossa filmografia, a explicação parece forçada, ou no mínimo insuficiente. Na verdade, acho que fazemos o Não quando ele, por algum motivo, se torna necessário, ou parece se tornar. Como este blogue, imagino. E como os filmes. Sei lá.

Capa do Não 56, de julho de 1998, editado pelo Carlos Gerbase

Voltando a insistir (pela última vez, juro):

Pra quem pensava que o Não tinha ido embora, “olha ele aqui traveiz”, como diriam o Adoniran e o pessoal da Terreira. Depois de dois anos no limbo do hiperespaço, o Não volta em seu número 83, enxuto e temático (“tecnologia e contracultura” é o nome do jogo), com edição do Cesar Brod e textos de Albert Siedler, Ariela Boaventura, Carlos Gerbase, Eloar Guazzelli Filho, Gaby Benedyct, Giba Assis Brasil, Joice Käfer, Pedro dos Santos de Borba e Roberto Tietzmann.

O endereço, pra quem não lembra mais, é
http://www.nao-til.com.br