Vejo por mim

por Jorge Furtado
em 19 de outubro de 2008

Da janela da minha casa vejo uma boa faixa da cidade que se estende ao sul. Vejo vários bairros, classes A, B, C, D e E. Ao norte vejo uma praça cercada de edifícios altos, perto do cruzamento de duas grandes avenidas. Vejo também, mais próximos do que eu gostaria que estivessem, alguns prédios grandes, com muitos apartamentos.

Em vésperas de eleição para prefeito, minha vista da janela é uma boa amostra da tendência eleitoral da cidade. Embora com alguns desvios estatísticos, é uma amostragem muito maior do que a dos institutos de pesquisa, que não escutam mais que duas mil pessoas, no máximo. É só eu contar o número de bandeiras e cartazes de um ou outro candidato e já imagino o que vai acontecer. Sim, há o eleitor enrustido, o que não revela seu voto a ninguém, muito menos na janela de casa, mas a porcentagem de sábios tímidos - que felizmente é bem alta - se equivale em todas as tendências políticas.

Falta uma semana para a eleição em Porto Alegre e a pesquisa que acabei de fazer (sábado, 18.10.08, 09:22), apresenta um resultado impressionante, revelador e, garanto, inédito: não há nenhuma bandeira de nenhum candidato à vista em qualquer direção.

Discute-se a capacidade de transferência de voto, o peso da reeleição na disputa, as tendências da composições partidárias que apóiam o candidato, mas acho que a pesquisa da minha janela indica o seguinte. Primeiro: apoiar um ou outro candidato a prefeito não dá glória nem envergonha ninguém (felizmente tenho amigos que votam e pensam muito diferente de mim). Segundo: numa eleição municipal o mais importante é o candidato e que ele demonstre capacidade de fazer um bom trabalho como prefeito. Terceiro: os partidos políticos e suas bandeiras perderam importância.

A democracia, acho, tende a melhorar com o uso. Nossas primeiras eleições pós-ditadura propunham escolhas radicais, não conhecia ninguém que votou no Collor e ele se elegeu com facilidade. Tudo mudou, felizmente. Pena que os partidos políticos se confundiram tanto.

A impressão que tenho é que todas as grandes cidades levaram os dois melhores candidatos ao segundo turno. Votei na Maria do Rosário no primeiro turno e vou votar outra vez agora, ela é uma ótima deputada e tenho certeza que será uma boa prefeita. Mas eu acho que o Fogaça fez um bom governo. Manteve coisas boas da prefeitura petista - como o Porto Alegre Em Cena e o Orçamento Participativo - e tornou menos emocional o debate político, o que sempre é um avanço. A prefeitura deve ter errado em muitas coisas que eu não sei e acertado em tantas outras, como sempre. Seja qual for o prefeito eleito, espero que impeça a destruição da orla do Guaíba pelos edifícios horríveis que apareceram no jornal estes dias. Logo agora que a cidade ganhou o lindo prédio da Fundação Iberê bem ali na vizinhança, tem gente querendo, por pura cobiça, destruir a paisagem junto ao rio. O prefeito que deixar isso acontecer vai entrar para a história da cidade pela porta dos fundos.

No Rio, torço por Gabeira, seria uma boa novidade nascida por lá, mais uma. A saída de Gabeira do PT, por suas desavenças com José Dirceu, foi um péssimo sinal do que estava acontecendo no primeiro mandato do Lula. Felizmente o governo mudou de rumo e de turma, desde então.

Nada sei sobre Kassab e não votaria num candidato dos Democratas (ex-PFL) - partidos perderam importância, ideologias não - mas entendo que São Paulo queira elegê-lo, ainda mais depois da barbeiragem da equipe de Marta. Simpatizo com as idéias de Marta e chego a duvidar que ela soubesse da propaganda que questiona a vida privada de seu adversário e claramente insinua que ele é gay, não me venham com sofismas agora, depois das pesquisas de “ricól”. Pesquisas indicam tendências, não substituem opinião, integridade e bom senso. A gritaria da mídia, serrista até os ossos, não pode ser levada muito a sério - houve até quem aproveitasse para dar o troco, lembrando aos seus leitores de supostos segredos de alcova de Marta - mas que a campanha de uma mulher que se notabilizou pela defesa dos direitos das minorias divulgue na televisão uma propaganda homofóbica em busca de alguns pontos de ibope dá bem a medida do que a política partidária se tornou. Em São Paulo, onde o jogo é sempre mais duro, a idéia de que “os fins justificam os meios” tem se tornado bastante popular em qualquer ideologia.

E por falar nisso, de onde veio o dinheiro do dossiê? E para onde foi o dinheiro do dossiê? E quem escreveu (e quem leu) “uiscão” no lista de compras dos cartões corporativos, provocando a “cpi do uiscão”? E as malas da Abin, grampeiam ou não? E o áudio do grampo? No grampo que não se ouve (porque não houve?) e que enaltece os grampeados (porque não houve?), quem estava mentindo? A revista? O juiz? O senador? Um deles? Dois deles? Três deles? E o Picasso do INSS? Onde anda?

Em Belo Horizonte, torço por Marcio Lacerda (PSB). Seu adversário, Leonardo Quintão (PMDB), o acusou de ladrão de bancos, com base nos arquivos da polícia da ditadura. Lacerda é apoiado por PT e PSDB, costura feita pelo governador Aécio Neves. Quintão é apoiado pelo ministro Helio Costa.

Em Canoas, torço por Jairo Jorge (PT), amigo de longa data, estou certo de que ele fará um ótimo governo. Jairo tem, desde que eu o conheço, há 27 anos, um extraordinário senso de justiça aliado a uma preocupação constante com os desvalidos, uma combinação que faz bem à política. Hoje vi a foto de Jairo no jornal, ao lado de antigos e atuais adversários do PT, o partido dele.

Vejo por mim: torço por candidatos do PT, do PSB, do PMDB e do PV. A capacidade de conviver e trabalhar com as diferenças, parece, vai eleger muita gente. Mais um ponto para a democracia.

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Nos Estados Unidos, a mais antiga democracia em atividade, a moral andava baixa. A democracia deles andou mal das pernas, contando votos de papel na Flórida e roubando na conta, elegendo e reelegendo um abobado cercado de oportunistas belicosos e místicos tapados, mas parece que vai renascer em novembro. A eleição de Obama, um negro no emprego mais importante do planeta, não é pouca coisa.

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Por falar nisso, Paris tem um prefeito gay. Estive por lá este ano, a cidade anda bem bonitinha. Quem sabe, depois da Maria do Rosário, que será nossa primeira prefeita, Porto Alegre (Gay Harbour) elege o seu primeiro prefeito gay? Vamos perder mais essa pro Rio e pra São Paulo?

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Para assinar o manifesto CONTRA o projeto do Portal do Estaleiro:

http://www.abaixoassinado.org/abaixoassinados/1571

Projeto do Portal do Estaleiro


COMENTÁRIOS

Enviado por Vica em 23 de outubro de 2008.

Acho que vamos de mal a pior no quesito candidatos… mas vou votar contra esse projeto horroroso.