Duas letras

por Jorge Furtado
em 07 de maio de 2010

Se eu disser que, em 1998, o governo FHC gastou mais de 40 milhões de dólares das reservas brasileiras para manter o real valendo o mesmo que um dólar até o dia da sua reeleição, você acredita? E se eu disser que, em 1998, o governo FHC gastou mais de 40 bilhões de dólares das reservas brasileiras para manter o real valendo o mesmo que um dólar até o dia da sua reeleição, você acredita? Bom, a afirmativa certa é a segunda “bilhões”. (1)

Para um ser humano normal, 40 milhões de dólares e 40 bilhões de dólares significam a mesma coisa, isto é, um dinheiro que ele nunca vai ver na vida. Um país, um governo, uma bolsa de valores, Bill Gates, Eike Batista ou Daniel Dantas sabem muito bem a diferença entre bilhão e milhão, não são apenas duas letrinhas no teclado, separadas pela letra n, de nada.

Parece que ontem, em Wall Street, um operador da bolsa americana, que tem que saber muito bem a diferença de 3 zeros à direita, escreveu “billion” ao invés de “million” numa ordem de vendas de ações de uma empresa, a Procter and Gamble (2), e derrubou o sistema capitalista mundial. A bolsa de New York perdeu 9% em uma hora. O erro foi rapidamente corrigido mas as bolsas despencaram no mundo todo, ainda não há cálculos das perdas e ganhos. (3)

Um sistema onde um erro de datilografia e os protestos dos gregos contra as maracutaias dos bancos e do governo - que vão acabar estourando, como sempre, no bolso dos mais pobres - pode interferir na produção mundial de fraldas, tintura de cabelo, absorventes higiênicos e hipoglós, é tão complexo e frágil que se assemelha ao misticismo, um pensamento mágico. Impossível deixar de lembrar do profeta Raul Seixas:

“A civilização se tornou complicada
Que ficou tão frágil como um computador
Que se uma criança descobrir
O calcanhar de Aquiles
Com um só palito pára o motor”

As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor

Pra ouvir e ver Raul:
https://youtu.be/izBUsaO5H4g

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(1) A rigor, a primeira afirmativa não está errada, ele gastou mesmo 40 milhões, mil vezes.

(2) A Procter and Gamble é uma empresa enorme, produz especialmente remédios, produtos de higiene e limpeza. São dela, por exemplo, toda a linha da Gillette, toda a linha Oral-B, Always, Tampax, Vick, Hipoglos, Metamucil, Pantene, Wella, fraldas Pampers, além dos eletrodomésticos Braum e das pilhas Duracell.

(3) Calcula-se que, em 8 minutos, sumiram 1 trilhão de dólares do mercado de ações. Não perca a conta, um trilhão são mil bilhões, que são mil milhões.

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The difference between a B and an M may have caused Thursday’s heart-stopping Dow plunge of nearly 1,000 points. A trader may have accidentally entered $16 billion - instead of $16 million - in a deal involving Procter and Gamble, sparking the massive selloff, according to multiple reports.

http://www.nydailynews.com/
Horas depois, ninguém sabe o que ocorreu, e está sendo investigada a possibilidade da queda ter começado pelo erro de um operador, aparentemente do Citigroup, que em vez de teclar a letra “m” de milhão, apertou a “b” de bilhão, quando acertava uma venda de 16 milhões de dólares, não de 16 bilhões.

http://www.estadao.com.br

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Un error en el registro del precio de acciones - un operador tecleó million, millón, en vez de billion, mil millones, al reportar el valor de una empresa, según las primeras investigaciones- provocó que en menos de media hora el índice Dow Jones, el indicador de referencia en Wall Street, se desplomara 998 puntos, caída que no ocurrió siquiera el 16 de septiembre de 2008, un día después de que la quiebra de Lehmann Brothers detonara la mayor recesión desde los años 20 del siglo pasado.

Nueva York, 6 de mayo. La bolsa de valores de Nueva York, el principal mercado de acciones del mundo, vivió este jueves momentos de verdadero pánico cuando su principal indicador perdió casi mil puntos en sólo una hora, equivalentes a 9 por ciento. Al momento que el índice Dow Jones se hundía, las pantallas de televisión en el piso de remates de Wall Street transmitían imágenes de la policía griega lanzando gases lacrimógenos contra manifestantes mientras el parlamento helénico votaba a favor de un duro plan de ajuste económico que ha llevado a la crispación social al país mediterráneo.

Fue un caos absoluto, comentó Steven Starker, cofundador de la firma financiera BTIG LLC a The Wall Street Journal. La volatilidad que vivió la bolsa de Nueva York llevó al principal indicador de esa plaza a perder hasta 998 puntos en una hora, el mayor desplome en su historia en un lapso así. La volatilidad durante 30 minutos hizo recordar a los operadores la corrida de venta de acciones que desembocó en el colapso del mercado en octubre de 1987, refirió el Journal.

http://www.jornada.unam.mx/2010/05/07/index.php?section=economia&article=022n1eco

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TEORIAS TENTAM EXPLICAR A ‘GRANDE QUEBRA DAS 14H42’
08 de maio de 2010 | 0h 00
Patrícia Campos Mello - O Estado de S.Paulo

Um operador desastrado, com “dedos gordos”, digitou bilhões em vez de milhões e, com isso, acarretou “a grande quebra das 14h42”, como está sendo chamado o tombo de 9% que o índice Dow Jones levou na quinta-feira, antes de se recuperar e fechar em baixa de 3,2%.

O operador estaria em Chicago, seria funcionário do Citigroup, e teria feito uma venda de US$ 16 bilhões em um tipo de ação que imita o desempenho do S&P 500, em vez de digitar US$ 16 milhões. Esse erro teria desencadeado um efeito dominó de vendas de ações em diferentes bolsas e mercados de balcão, levando à maior queda intraday da história do índice Dow Jones, de 1.000 pontos. Em oito minutos, sumiu quase US$ 1 trilhão em valor de mercado. As ações da Procter & Gamble caíram de US$ 60 para US$ 39,37 e subiram de novo em minutos. O papel da Accenture abriu cotado a US$ 41,94 e chegou a ser vendido a centavos de dólar.

A teoria do “operador de dedos gordos” é emocionante e dominou blogs, canais financeiros e sites de notícias. Mas, aparentemente, o tombo fenomenal do mercado americano está mais relacionado ao trading de alta-frequência e à proliferação de mercados de ações pouco regulamentados, embora ninguém saiba exatamente o que causou o crash das 14h42.

Hoje em dia, dois terços das transações de ações nos EUA são feitas por meio de trading de alta-frequência, que se dá por meio de computadores que usam algoritmos para determinar quando comprar e vender ações, quantas ações comprar e quais. Esses algoritmos, às vezes, respondem a gatilhos, desencadeando ondas de vendas quando um índice ou determinada ação cai ou sobe um certo porcentual. E, além disso, com ajuda dos computadores superpotentes, os traders que usam alta-frequência podem rastrear transações em dezenas de mercados, obtendo vantagem sobre investidores comuns. Uma das teorias que circulava ontem é que um algoritmo respondeu à grande alta do iene na abertura do mercado na quinta-feira, desencadeando vendas nos EUA. Outra teoria seria de que algum operador de grande banco teria errado em uma transação com a ação da Procter & Gamble.

O Citigroup divulgou nota desmentindo os rumores de que um de seus funcionários teria cometido um erro em uma transação de ações.