Contra o voto em lista

por Jorge Furtado
em 04 de abril de 2011

O Elio Gaspari, na Folha de domingo, voltou a um assunto da maior importância: a adoção do “voto em lista”, parte da proposta de reforma política defendida por muita gente. Escrevi sobre o assunto logo depois do primeiro turno das eleições presidenciais. Marina era a única contra o voto em lista.

Dilma, na campanha, se manifestou publicamente a favor do voto em lista:

“Sou a favor de uma reforma política, para que haja financiamento público de campanha, voto em lista, para que haja um reforço dos partidos. (…) Seria prudente que fosse por uma Constituinte exclusiva pra tratar dessa questão”
[Roda Viva, em 27.06.2010]
Fonte

Serra também defendeu o voto em lista:
[sobre a reforma política]

-- (…) Começaria por aí já na próxima eleição. Eleito, vou me jogar a partir de janeiro para fazer isso. Deputados em geral são ligados a prefeitos de cidades médias e pequenas. Prefiro um tipo de voto distrital misto porque uma coisa é uma cidade mais homogênea. Estado complica um pouco. Em segundo, o voto em lista. A campanha eleitoral seria muito mais, a questão da chapa, haveria um debate maior. Resolve o problema de oligarquia partidária? Não, mas melhora o custo da campanha.
Fonte

Muita gente fala na necessidade de uma reforma política, uma que termine com os suplentes no senado (um escândalo), que institua o financiamento público das campanhas (sou a favor), o voto distrital (tenho dúvidas, depende do sistema) e o voto em lista.

Voto em lista? Sou contra, muito contra.

Quero ter o direito de escolher não apenas o partido, mas qual deputado de qual partido vai me representar no Congresso.

O voto em lista favorece o coronelismo, impede o eleitor de renovar os quadros partidários, estimula os burocratas e a corrupção, prejudica lideranças jovens, retira do eleitor - e entrega para os velhos coronéis políticos - o poder de escolher seus representantes.

Sou totalmente contra a adoção do voto em lista e tenho a firme convicção de que a maioria dos brasileiros também seria, se fosse esclarecido que o sistema vai retirar do eleitor o direito de escolher seus representantes no congresso, nas assembléias estaduais e nas câmaras de vereadores, direito que será transferido aos caciques partidários, virtualmente eleitos antes da eleição.

Contra o voto em lista, Gaspari lembra as sábias palavras de Miguel Arraes:

O SÁBIO ARRAES

Em 2003, durante uma das tentativas fracassadas para se instituir o voto de lista, o deputado Aldo Rebelo foi encarregado de tentar convencer Miguel Arraes de que a mudança moralizaria as disputas eleitorais. Deu-se o seguinte, na narrativa de Rebelo: “Eu falei durante quase uma hora, e Arraes, que era de poucas palavras, ficou cachimbando. Quando terminei, ele perguntou: “O senhor sabe me dizer quanto vai custar um bom lugar nessa lista?’”

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Você sabe o que é voto em lista?

Da wikipedia: voto em lista é uma das formas de regra de sufrágio. É adotada em diversos países e está dentro das propostas de reforma política no Brasil. Por este sistema, nas eleições proporcionais (para deputados e vereadores) o eleitor não vota em um candidato, mas numa lista, proposta pelo partido político. De acordo com o quociente eleitoral, se calcula quantos candidatos aquela lista poderá eleger, e eles serão eleitos, não na ordem em que forem votados, como atualmente acontece, mas na ordem em que foram propostos na lista.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Voto_em_lista

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ELIO GASPARI, na Folha de S. Paulo, 3.4.11

O PT QUER APROVAR A LISTA SEM TER OS VOTOS

Se deixarem, com apoio de 129 deputados, o comissariado imporá uma reforma eleitoral que demanda 308

O COMISSARIADO PETISTA planeja um golpe regimental para impor ao país um sistema eleitoral pelo qual os cidadãos perderão o direito de votar nominalmente em seus candidatos para a Câmara.

Com o apoio do DEM, o PT conseguiu que a comissão do Senado encarregada de estudar a reforma política recomendasse a instituição do voto de lista. Nele, as direções partidárias enumeram seus candidatos, deixando à patuleia apenas o direito de escolher uma sigla.

O resultado dessa votação quer dizer pouca coisa. O golpe está noutro lugar, escondido.

Imagine-se a seguinte situação: chega-se ao mês de setembro e os plenários da Câmara e do Senado apreciarão as propostas de emendas constitucionais necessárias para que se aprove a reforma.

Uma quer o distritão, outra, o distrital puro e uma terceira sugere um sistema misto. Para ser aprovada, qualquer emenda precisa de três quintos dos votos de cada Casa. Ou seja, o apoio de 308 dos 513 deputados e de 49 dos 81 senadores. Cada emenda vai a voto e nenhuma consegue passar.

Nessa hora aparece um sábio pedindo que se passe à votação dos projetos de lei existentes na Casa. Há um, instituindo o voto de lista. Já foi rebarbado duas vezes, mas não custa apreciá-lo de novo. Como se trata de lei ordinária, não demanda três quintos. Basta a maioria simples. No caso da Câmara, uma reforma política travada pela falta de 308 votos poderá ser aprovada por apenas 129 deputados, numa sessão de frequência mínima. Admitindo-se que o plenário esteja lotado, a mudança passa se tiver 257 votos.

Os defensores da lista querem criar a figura do deputado sem eleitor. Tudo bem, mas devem se submeter aos três quintos exigidos pela Constituição. Senão, trata-se de uma tunga regimental para alavancar outra, cassando o direito dos brasileiros de escolher seus deputados pelo voto nominal e direto.