por Jorge Furtado
em 27 de junho de 2013
Ó Deus Autor e Roteirista, mestre dos caminhos e das intrigas, patrono de todos os encontros, faísca de todas as separações, juiz de todas as causas, algoz e protetor dos personagens, arquiteto de todos os cenários, semeador de ganchos e plots, vigia dos arcos longos e curtos, artista das viradas, ó senhor Autor e Roteirista, nós respeitaremos teus atos mas tende piedade do diretor!
Não escreva nada que não possamos filmar, pois filmar é nosso único e precário dom.
Não escreva câmera, pois ela não podemos filmar, já que é com ela que filmamos.
Não escreva vemos, pois que tudo vemos, se é que vemos algo.
Não descreva brevemente ações longas, nem longamente ações breves.
Não escreva o que o personagem - se é que haverá um - sente, lembra, pensa ou ignora, pois só podemos filmar o que ele faz, vê, escuta e diz.
Não escreva o que o público - se é que haverá um - sente ao ver a cena, pois não podemos filmar o que o público sente.
Tende piedade do diretor. E tende piedade do público!
Se há uma história para contar, conte-a, não a esconda. Não obrigue o leitor, espectador, nosso cliente, a um grande esforço para simplesmente entender o que está acontecendo. Se não há uma história para contar, encontre e mostre, ou mude de profissão.
Histórias devem divertir e ensinar, num mesmo gesto. Se apenas divertem, logo são esquecidas, são inúteis. Se apenas ensinam, não são ouvidas, também são inúteis.
Criar alguém a imagem e semelhança do homem é tua tarefa, ó soberano das tramas! Alguém que como tu, como nós e todos os homens, quer muito alguma coisa e tem dificuldade para consegui-la. Imaginar e descrever este alguém, que coisa é esta, porque ele a deseja tanto, qual a força e a natureza desta dificuldade, esta é tua missão, ó guia de todas as trilhas!
Tende piedade de nós, ó senhor Autor e Roteirista, e nós te cobriremos de cenas e glórias!
Aleluia!