Que capangas?

por Jorge Furtado
em 26 de abril de 2009

“Vossa Excelência não está na rua, Vossa Excelência está na mídia, destruindo a credibilidade da Justiça brasileira. Vossa Excelência não está falando com seus capangas do Mato Grosso”.

Ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, dirigindo-se ao Presidente do mesmo Tribunal, Ministro Gilmar Mendes. Brasília, 22 de abril de 2009.

Pergunta: que capangas do Mato Grosso? Quem não lê a Carta Capital, o blog do Luis Nassif, do Azenha, do Paulo Henrique Amorim, o RS Urgente, sabia ao menos que o ministro Gilmar Mendes era de Mato Grosso? Sabe das atividades da família Mendes em Diamantino? Sabe algo da carreira de Gilmar Mendes, além do fato dele soltar o Daniel Dantas sempre que a polícia tenta prendê-lo? Sabe que Gilmar Mendes, que até anteontem era desconhecido da imensa maioria do povo brasileiro e que jamais recebeu um voto de quem quer que seja, chamou o presidente Lula “às falas”? Sabe que Gilmar Mendes mandou - e foi atendido - tirar do ar um programa da TV Senado onde o jornalista Leandro Fortes (Carta Capital) fazia críticas à sua atuação no STF? Sabe que Gilmar Mendes, na melhor das hipóteses, avalizou sem pestanejar a fraude do “grampo sem áudio”, forjando uma crise institucional amplamente noticiada pela imprensa e que acabou, ora veja, beneficiando bandidos milionários? Sabem que Gilmar Mendes, com a ajuda do seu antigo chefe, o Ministro Nelson Jobim - que mostrou ao presidente Lula os documentos que provariam a capacidade dos equipamentos da Abin de fazer grampos telefônicos e que, na verdade, provavam exatamente o oposto - mandou Paulo Lacerda, o policial que tentava prender bandidos milionários, para o desterro em Portugal?

Pois duvido. A maior novidade no atual momento da política brasileira é a desfaçatez com que, em orgânica sincronia, a imprensa brasileira, na defesa de interesses desconhecidos pelos seus leitores, distorce, omite, ignora ou, pior, simplesmente contraria a verdade dos fatos. O mais alto juiz da nação é acusado por um Ministro do STF, seu colega de corte, de ter “capangas” (1) e de estar “destruindo a credibilidade da justiça brasileira” e, um dia depois, a imprensa trata o caso como um “bate-boca superado”, resultado do “destempero” dos ministros, uma briguinha de pátio de escola, pronto, já passou. Capangas? Não são aquelas bolsinhas de carregar documentos?

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O jornalismo tapioca dá manchetes a besteiras de 10 reais, transforma a compra de meia-dúzia de “bailarinas” (arranjos florais) numa colossal manchete da edição de domingo, sugerindo, oba!, um possível escândalo sexual financiado com verbas públicas; pergunta dez mil vezes “de onde veio o dinheiro do dossiê?” e, 5 minutos depois da eleição, não tem mais o mínimo interesse em saber “de onde veio o dinheiro do dossiê?”; inventa, contrariando as mais gritantes evidências, um valioso quadro de Picasso abandonado nas dependências no INSS; apela para a mentira descarada, com a clara intenção de influenciar no resultado das eleições, ao publicar como verdadeiras as declarações do delegado Edmilson Pereira Bruno, que sabia serem falsas; leva para as manchetes de capa a palavra “suposta” (“Supostas contas no exterior…” Supostas? Quem supõe?); publica fichas policiais criadas no photoshop por grupos de saudosos da ditadura como se fossem documentos públicos. O jornalismo tapioca inventa, manipula, distorce, omite e, se for preciso, mente. O jornalismo tapioca mente nas manchetes de capa da edição de domingo (a de maior circulação) e reconhece que mentiu na página 12 da edição de sábado (a de menor circulação). O jornalismo tapioca faz tudo isso e muito mais enquanto ignora ou relega às letras miúdas a roubalheira de bilhões. Era de se esperar que acabasse, como está agora, muito mal na foto, acompanhado dos bufões de opereta que ele mesmo pariu. Mas já há sinais de desembarque, como se percebe na nota publicada pelo Estadão.

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Parece evidente que os atuais próceres da república são animais da era pré-internética, ainda crêem na ilimitada capacidade de “produção de consenso” (Chomsky) da velha imprensa. É certo que os velhos jornais, televisão e o rádio ainda influenciam muita gente, mas hoje, com centenas de canais de informação, sites e blogs com variados graus de independência e das mais diversas matizes ideológicas, a mentira, que já tinha pernas curtas, está perneta. A máxima do Pasquim, “Se você não está em dúvida é porque foi mal informado”, pode ser perseguida com certa facilidade, basta não sucumbir às toneladas de manchetes manipuladoras. Talvez seja por isso que a grande imprensa esteja diminuindo. Quem ainda paga para ser mal informado quando pode ser bem informado de graça?

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No momento em que quase todos, mais do que nunca, repetem que “políticos são todos ladrões” e que “política é tudo a mesma coisa”, me permito dissentir. Nunca me arrependi dos meus votos. Tive sorte? Acho que não. Votei 8 vezes para presidente (considerando primeiros e segundos turnos), sempre no Lula. (Aliás, Lula também votou 8 vezes para presidente, sempre nele mesmo, suponho.) Já votei em Olivio Dutra, Tarso Genro e Raul Pont, para a prefeitura de Porto Alegre o para o governo gaúcho. Votei também nos senadores Pedro Simon e Paulo Paim, no deputado Henrique Fontana, no deputado Flavio Koutzi, na candidata (não-eleita) ao senado Vera Guasso e em vários candidatos a vereador, alguns eleitos outros não, candidatos do PT, PMDB ou do PSOL. Repito: nunca me arrependi dos meus votos. Há centenas de políticos honestos, desempenhando a tarefa indispensável de manter viva a democracia brasileira. Não digam que são todos iguais. E, se disserem, não acreditem. Basta saber escolher.

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A democracia se auto-aperfeiçoa e, na minha opinião, não pára de melhorar. Lula é muito melhor que FHC, que foi melhor que Itamar, que foi melhor que Collor, que foi melhor que a ditadura (qualquer coisa é). E tudo leva a crer que, com Dilma ou Ciro, a democracia brasileira vai continuar melhorando. A história não anda de ré e, como se sabe, só se repete como farsa.

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E, antes que eu me esqueça:

De onde veio o dinheiro do dossiê?

Cadê o áudio do grampo?

E cadê o Picasso do INSS?


(1) Do Houaiss: Capanga, do quimbundo, kappanga ‘entre sovaco’; ‘bolsa usada por viajantes para carregarem pequenos objetos e diamantes nos garimpos’, a palavra também ganhou a acepção ‘guarda-costas’, porque os comerciantes que compravam o produto dos garimpeiros naturalmente os protegiam, mandando-lhes avisos quando havia batidas policiais nos garimpos. Ver: guarda-costas, jagunço, cangaceiro.


Você não está em dúvida? Economize seu dinheiro e não perca tempo:

http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/

http://www.cartacapital.com.br/app/index.jsp

http://www.viomundo.com.br/

http://terramagazine.terra.com.br/

http://www2.paulohenriqueamorim.com.br/

http://www.rsurgente.net/


COMENTÁRIOS

Enviado por giba em 28 de abril de 2009.

E digo mais: eu não me arrependi nem mesmo quando votei no Collares pra governador, no segundo turno de 1986. Continuo achando que a alternativa era pior.

Enviado por Rico Assoni em 04 de junho de 2009.

Tambem votei, na maior parte, nos mesmos candidatos e não me arrependo. Tem muita gente séria fazedo um bom trabalho por umas Brasil mais justo e soberano. - Boa Luta!

Enviado por Jorge Furtado em 30 de abril de 2009.

Nesta eu dei sorte, estava vajando e não precisei escolher entre o Collares e o Marchezan. Teria votado no Collares.