Argumentos racionais, por favor.

por Jorge Furtado
em 14 de setembro de 2014

A reação de Marina às críticas que tem recebido sobre o seu programa de governo, suas ideias e as ideias de sua equipe, é simplesmente infantil, irracional, e não contribui com a imagem de alguém que postula o cargo de Presidente da República.

Marina tem uma longa história de luta por grandes causas, elegeu-se várias vezes (sempre pelo PT) e ocupou cargos importantes, tem currículo de sobra para ser presidente. Mas não pode simplesmente cair no choro quando alguém questiona se é boa a sua ideia (os bancos gostam) de dar autonomia, por lei, para o Banco Central. Se é boa a sua ideia (os bancos também gostam) de acabar com a parte do dinheiro que deve ser emprestado a juros baixos, por exemplo, para a construção de casas populares. Ou quando alguém questiona o quanto devemos investir no pré-sal, se é bom mesmo esquecer o Mercosul (os americanos gostam) ou qual será, no seu governo, a política brasileira a respeito das pesquisas com as células tronco. (1) (2)

Marina também não deveria acusar o partido pelo qual ela militou por 27 anos, como Deputada Federal, Senadora e Ministro de Estado, de ter colocado alguém “para roubar na Petrobras”. A acusação é grave e falsa. O tal diretor - que ainda não foi julgado mas já teria confessado alguns crimes - é funcionário de carreira da empresa, ganhou cargos de direção no governo tucano. Não se sabe quando ele começou a roubar a Petrobras mas se sabe quando ele parou de roubar a Petrobras: foi no governo do PT.

Também não tem ninguém falando, seriamente, da religiosidade de Marina, está combinado que cada um tem a sua e o estado não tem nenhuma, é laico e assim deve ser. Mas ela não devia prestar falso testemunho. Um dia desses, em entrevista a O Globo, Marina afirmou: “Me deram um relatório de um projeto que obrigava a colocar bíblias em todas as bibliotecas. Eu dei parecer contrário.” O Globo contestou a informação, mostrou o projeto, não é verdade, Marina não deu qualquer parecer sobre a matéria. (3)

(Vejam como são as coisas: Marina é religiosa e disse que deu parecer contrário a um projeto de lei que obrigava cada biblioteca escolar a ter uma Bíblia, não era verdade, ela não deu parecer algum. Pois eu, que não sou religioso, acho que o projeto deveria ser aprovado, acho que toda biblioteca deveria ter uma Bíblia, um livro admirável e cuja leitura é fundamental para se entender o mundo, como o Dom Quixote de Cervantes e os Ensaios de Montaigne, que também deveriam ser obrigatórios em qualquer biblioteca.)

Ninguém está criticando, seriamente, a trajetória pessoal de Marina, uma história de luta e superação, mas é difícil engolir sua declaração, em entrevista ao Estado de São Paulo, quando diz estar sendo criticada por ser “filha de pobre, preta e evangélica”. Acho que este coitadismo não cola, imagino que pouca gente escolha um presidente da república pensando: “Vou votar nela, coitada”. Até porque as ideias da Marina e turma parecem filhas de rico, brancas e nada evangélicas.

Ninguém está falando mal da Marina, ela não precisa chorar, a questão é como governar o país.

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(1) Marina e Beto Albuquerque divergem sobre as pesquisas com célula tronco. Ela é contra:
http://oglobo.globo.com/brasil/vice-divergiu-de-marina-sobre-pesquisa-com-celula-tronco-13690067

(2) Luis Fernando Veríssimo e a pesquisa com as células tronco:
http://oglobo.globo.com/opiniao/marina-13925362?topico=verissimo

(3) Marina e a Bíblia:
http://oglobo.globo.com/blogs/preto-no-branco/posts/2014/09/11/marina-biblias-549261.asp

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Atualizado em 15.09.14

STIGLITZ: INDEPENDÊNCIA DO BANCO CENTRAL É DESNECESSÁRIA E IMPOSSÍVEL
por LUCAS KAWA, no Business Insider
de 3 de janeiro de 2013

Joseph Stiglitz, duas vezes vencedor do Prêmio Nobel e um dos economistas mais famosos de nossa época, disparou uma barragem verbal contra a independência do Banco Central hoje na C D Deshmukh Memorial Lecture, na Índia, segundo o The Times of India.

Ironicamente, ele falou logo depois de Duvvuri Subbaro, que governa o Reserve Bank, que apresentou Stiglitz depois de argumentar pelo aumento da autonomia do banco central da Índia.

De acordo com Stiglitz, a autonomia do banco central é superestimada - já que não se correlaciona necessariamente com melhor performance econômica - e impraticável:

”[A crise] demonstrou que um dos princípios centrais defendidos pelos banqueiros ocidentais - o desejo de independência do banco central - é no mínimo questionável. Na crise, países com menor independência do banco central - China, Índia e Brasil - se deram muito, muito melhor que países com bancos centrais independentes, na Europa e nos Estados Unidos. Não existem instituições verdadeiramente independentes. Todas as instituições públicas respondem a alguém e a verdadeira pergunta é a quem”.

Ele acredita que, antes da crise financeira [de 2008], o Federal Reserve [Banco Central dos Estados Unidos] respondia apenas a Wall Street, e reservou ao presidente do Fed em Nova York, William Dudley, críticas especialmente duras. Stiglitz alega que Dudley foi “um modelo de governança ruim” por causa de um conflito de interesses inerente: ele salvou os mesmos bancos que deveria ter regulamentado e fiscalizado - os mesmos bancos que permitiram a Dudley conquistar seu cargo.

Segundo a agência de notícias Reuters, a ideia de independência do banco central está sob cerco em todo o mundo. A tendência é sem dúvida liderada pelo recém-eleito primeiro ministro do Japão, Shinzo Abe, que tem pressionado fortemente o Banco do Japão no sentido de promover o chamado Quantitative Easing para combater a deflação, desvalorizar o yen e acelerar o crescimento econômico.

O original:

According to Stiglitz, central bank independence is both overrated, since it does not necessarily correlate with better economic performance, and unfeasible:

”[The crisis] has shown that one of the central principles advocated by Western central bankers- the desirability of central bank independence-was questionable at best…In the crisis, countries with less independent central banks-China, India, and Brazil-did far, far better than countries with more independent central banks, Europe and the United States. There is no such thing as truly independent institutions. All public institutions are accountable, and the only question is to whom.”